22/09/2013

insónia

Deito-me às duas e acordo às cinco. Abro a primeira gaveta da cómoda e retiro as fotografias que foram para lá atiradas ao acaso. Na primeira foto estou ao colo da minha mãe, na seguinte estou com a minha filha ao colo. Sento-me na cama com uma foto em cada mão.
Sou de ontem e nada sei…
Antes do desfecho, existe o pesar. Nada aprendi com os meus pais, nada ensinei aos meus filhos. Pecadora, amei sem nunca dar conta do quanto odiei.
Sou de ontem e nada sei…
Coloco no chão a foto da minha mãe alinhada à cabeceira da minha cama. Dou quatro passos e coloco a foto da minha filha, alinhada ao meu ventre, se estivesse deitada na cama. Não há fotos que se alinhem com os meus pés, nem que preencham o resto do meu corpo.
Onde mora o intervalo da minha existência?
Sou de ontem e nada sei…
Tiro a gaveta da cómoda e jogo as fotos no chão. Umas caiem de costas. Haverá vida quando caímos com a cara colada ao chão? Deixo que a memória se reconstrua no puzzle que desenhei no chão. A minha mão direita treme, a esquerda sustenta meu corpo. Fecho os olhos e tiro uma foto. Abro os olhos. No chão entre a primeira e a última fotografia, vive a natureza do que fui.
Uma dezena de fotos e apareço em duas: a primeira e a última.
O meu passado sequer é uma sombra.
Sou de ontem e nada sei…

(esta dor que parece fazer morada permanente em mim, fala-me de um povo sem memória, diz-me como se fosse uma ladainha que ele é como a lapa que se agarra à rocha. por dentro mole.)

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