Da minha janela via o senhor José todos os dias. Umas vezes deitado, enroscado feito criança. Doutras sentado de olhos fechados. Nas pernas o chapéu barrento pedia ajuda. Na boca um obrigado apressado a quem com pressa largava a esmola. Não me lembro de o ver comer. Não sei de cor o cheiro dele. Não sei a cor dos seus olhos - nunca cruzei seu olhar.
Sinto frio quando me lembro do seu corpo durante o Inverno. No chão restos de papelão. No corpo um cobertor velho. No Verão tirava o casaco e mostrava sem pudor uma camisa sem cor.
Na memória seu nome por mim inventado – Senhor José, Zé da Esquina, Zé do Estrago, Zé sem sobrenome a rimar com Ninguém.
A esquina da rua Nossa Senhora de Jesus com a da Rua da Boa Morte era seu território ocupado.
Sempre pensei que os homens que dormem na rua, na rua nascem.
Hoje quando me deito sufoco de medo. Se me tirarem o cartão amassado no chão vou morrer de frio.
Nasci na Lapa, numa cama aquecida. Meu endereço? Desculpe, não me lembro do nome da esquina.
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