23/06/2006










Helena esquecida largou a estação da vida. No inverso dormia quando todos acordavam. Na contra-mão deixou de saber quando existia..

Cleo faz quase um ano que estive por essas paragens. As cores definidas, o contorno do olhar desenhando a fronteira do nosso esquecimento. De longe ouvíamos as gargalhadas de quem passava e restava no Passante.
E foi lá que ouvimos de passagem a história de Helena Serena. Quem conta um conto acrescenta sempre um ponto, não sei quantos nós desataram os viajantes mas Helena Serena com certeza não se importa com nenhum acrescento.
Um dia, é assim que começam as histórias não é? Pois bem, um dia, lembras-te Cleo? Helena Serena atendeu sem vontade a porta. A campainha insistente soou feito o lamento contínuo de quem sofre.
Desde esse dia Helena Serena esqueceu o presente. Abriu a porta e como se fosse um jogo de esconde-esconde resolveu se esconder noutro tempo. Num passe de mágica parou. Comia ao contrário, conjugava o verbo no tempo passado.
Todos os dias tudo se ia. Só Helena restava. De vez um quando um choro escondido no meio da sala.
Helena esquecida largou a estação da vida. No inverso dormia quando todos acordavam. Na contra-mão deixou de saber quando existia..
- Senhor Manuel quanto custa o aipim?
- O senhor Manuel morreu Helena Serena…
Nebuloso o olhar, tão triste Helena perdida. Assim Helena vive o passado julgando o presente. Resistente seu realejo canta a saudade doutro tempo. Desafinado embala o engano até que o sono tome seu corpo e descanse..
Nunca soube o fim da história Cleo. Lembro da Gueixa feliz no Passante distraindo as viagerinas turistas contando a lenda
Andei pelo bairro da Boa Morte, perguntei por Helena. Na rua os meninos gritavam:
- Brasileirinha. Branca. Helena viveu num tempo inventado. Serena se foi numa hora sem hora. Perdida perdeu-se no espaço…Brasileirinha branquinha procuras que tempo?
- Procuro o tempo… que Helena perdeu
- Vens de onde brasileira?
- Venho de um compasso desafinado. Procuro quem roubou o tempo de Helena, que também era meu
- Brasileirinha olha o horizonte, vês?
-….
- Vês o sol a dizer até amanhã?
-….
- Sempre o mesmo todos os dias
- Enquanto te perdes por Helena Serena perdes quem te visita todos os dias
-….
- A Luz teve um filho maroto. O galo acorda as seis da manhã. Na roça o cacau está quase maduro. Seis da tarde há peixe pescado na rede do pescador. Queres uma banana? Está tão doce!
Nesse dia voltei ao Passante contigo Cleo. Lá estava a Gueixa, lã estava a miss Universo – transformistas da vida inventando Helena. Nosso olhar desenhou o contorno da vida tão presente o sorriso delas.


Faz um ano que o presente regressou a ditar a vida.
O sol é tão laranja Cleo!

2 comentários:

  1. Ethel, são tuas as fotos? Que bonitas estão as fotos, que bonito está o texto. Viva o Presente. Um Beijo.

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  2. As fotos não são minhas - mas são mesmo bonitas. Como é bonito o olhar de quem olha para a camera. Obg pelo teu comentário. beijo

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